Coronel critica política repressiva e midiática do RS



“Brigada Militar recaptura foragido em Viamão”. Esse é o título da décima mensagem enviada na última sexta-feira, 25 de maio, pela Secretaria de Justiça e Segurança do Rio Grande do Sul a jornalistas do Brasil todo por e-mail. Diz o texto:

“Nessa quinta-feira (24/05), na RS/118, Km 09, às 22h05min, no município de Viamão, na Grande Porto Alegre, a guarnição de serviço do Grupo Rodoviário da BM local, em operação de fiscalização, procedeu a abordagem do indivíduo identificado como J.A.O.S, com 39 anos de idade, e constatou, após conferência documental, que o abordado se encontrava na condição de procurado pela Justiça, sendo preso e apresentado na Delegacia da Polícia de Alvorada.”

Talvez a nota tenha virado notícia em alguma rádio ou jornal local, mas em termos jornalísticos a informação não tem impacto que justifique um spam para toda a mídia nacional. Na tentativa de gerar repercussão, cerca de dez informes são enviados diariamente pela Secretaria de Justiça e Segurança do RS.

Essa política excessivamente midiática e focada na repressão ao crime foi criticada na última quinta-feira, 24 de maio, pelo ex-secretário de Direitos Humanos e Segurança Urbana de Porto Alegre, Coronel Luiz Antônio Brenner Guimarães. Representante da ONG Guayi no workshop “Ampliando a Rede de Policiais e Sociedade Civil na América Latina”, realizado no Rio de Janeiro, Brenner falou sobre a sensação de crescimento da criminalidade e o endurecimento da ação policial, que tem levado a segurança pública ao topo da discussão e disputa política.

De acordo com o coronel da reserva da Brigada Militar do RS, em nome da devolução da auto-estima da polícia, que teria sido abalada na década de 90, quando o governo estadual deu mais ênfase à prevenção do que ao confronto, propagam-se discursos como “polícia tem que ser polícia”, “polícia tem que atacar” e “este é um ano ruim para a bandidagem”. Brenner considera essa abordagem dos governos posteriores um retrocesso: “O discurso de endurecer e enfrentar o crime com repressão e divulgação midiática está levando a uma espiral que resulta em mais violência contra a polícia e contra a população.”

Brenner, que foi secretário municipal em 2004 e integra o Núcleo Violência, Segurança e Direitos Humanos da Guayi, afirma que diversos indicadores mostram o crescimento da violência no estado nos últimos anos. Apesar de os crimes violentos letais por cem mil habitantes terem diminuído de 26,6 em 2001 para 14,8 em 2005, representando a metade da média do Brasil, os crimes violentos não letais cresceram de 49,2 para 61,1 no mesmo período, atingindo uma média muito maior do que a brasileira, de 34,6. Segundo Brenner, nota-se ainda um agravamento da crueldade dos crimes. Os delitos de trânsito aumentaram de 219 para 288 por cada cem mil habitantes e os crimes contra o patrimônio de 570 para 670. Para ele, isso é resultado da falta de políticas de prevenção. “O roubo cresce por causas sociais”, afirma.

Em sua apresentação no workshop no Rio, Brenner fez um histórico da segurança pública no RS na última década. Segundo ele, no âmbito estadual algumas reformas fundamentais foram feitas na polícia entre 1995 e 1998, como o fim de atividades “meio”, que não competiam necessariamente à polícia, liberando mais efetivo para as ruas. Também houve mudanças estruturais, com alterações no Estatuto e nos níveis hierárquicos.

Entre 1999 e 2002 foi instituído um comando unificado das polícias, iniciaram-se estudos e experiências para integração das áreas operacionais e para a centralização do atendimento de emergência das polícias civil e militar, foi implantado o Boletim de Ocorrência Único entre as polícias, adotaram-se módulos comuns e integrados para o desenvolvimento da formação e a qualificação dos profissionais da área de segurança, valorizou-se o discurso por uma polícia técnica que respeite os direitos humanos, criou-se uma ouvidoria e uma portaria sobre o uso da arma baseado na ONU.

“A maioria da polícia era reativa às mudanças, houve muita discussão nestes quatro anos. A portaria sobre uso das armas virou chacota, o tema foi distorcido pela imprensa e virou questão central na disputa política”, lamenta Brenner.

De acordo com o coronel, no fim da década de 1990 a importância da atuação municipal no setor começou a se destacar. Em Porto Alegre, foi criada a Secretaria de Direitos Humanos e Segurança Urbana. “A concepção da secretaria era romper com a idéia tradicional de que direitos humanos e segurança urbana são elementos separados e antagônicos, quando na verdade compõem o mesmo fenômeno. O programa de prevenção da violência era o carro-chefe da Prefeitura”, conta o ex-secretário.

Brenner participou da elaboração de um Plano Municipal de Segurança Urbana que estimulava a discussão com a sociedade através de conselhos e fóruns de segurança para o planejamento de intervenções focalizadas e o desenvolvimento de metodologias de prevenção. Segundo ele, a gestão sucessora enfraqueceu os núcleos de direitos humanos da secretaria e investiu na guarda municipal com um perfil repressivo de polícia. “A nossa Guarda Municipal tinha um perfil de prevenção, fazia mediação em escolas, postos de saúde, espaços de cultura e esporte e abrigos para adolescentes infratores”, compara.

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